quinta-feira, abril 05, 2007

"A questão da geografia relacionada com a capacidade ou a competência dos artistas."

O Jornal On-Line Expresso das Ilhas (página da Cultura), na sequência do que agora se tornou moda nos jornais de Cabo Verde -> entrevistar artistas e procurar declarações bombásticas ->, entrevistou o meu primo Dani Mariano, músico, autor e compositor de belas canções e ex-vocalista/percussionista do grande grupo mindelense Kings.

A entrevista foi suave do início ao princípio do fim. No princípio do fim, o jornalista lança a isca e o Dani deixou-se pescar.

Basicamente o que aconteceu foi o jornalista ter tocado num ponto que abre a porta da galeria das asneiras e que fez com que o meu primo ficasse com a entrevista manchada.

Senão vejamos:

"(...) os melhores músicos estão em S. Vicente."
"(...) os melhores estão aqui. Existe algum pianista que toque também (*) a música cabo-verdiana como o Chico Serra, e ele vive no Mindelo; não há nenhum percussionista que toque como o Tey. "

É claro que afirmações deste tipo desencadeiam logo as mais diversas reacções.

Quero aqui transcrever extractos de algumas dessas reacções, inclusivé a minha, que espelham, na minha opinião, a forma como as coisas deviam ser vistas nesta altura do campeonato, em pleno século XXI.

João Gomes:

"É pena que ainda em 2007, ainda existam pessoas que vêem o mundo pelo único binóculo que possuem!
(...) Chico serra é um virtuoso? Voginha é extraordinário? Bau é um fenómeno? Sim, todos são isso mesmo, não porque moram no Mindelo, mas porque são, intrinsecamente, bons! E ponto final! "

Humberto Ramos:

"Na música nao existe melhor, pode existir diferente mas o conceito de melhor na música não existe, cada um tem o seu ouvido e ouve o que a sua limitação auditiva permite, logo não se pode falar de melhor."

Paló:

"Acredito que a melhor filosofia é pensar que CV tem produzido bons artistas ao longo da sua história, independentemente de serem desta ou daquela ilha. Pelo menos na minha óptica, é mais saudável para a mente, até porque essa do sampadjudo cu badiu já é "mesquinhice" a mais, démodé e deprimente."

Djinho Barbosa:

"Acredito que A TACV daria um grande contributo à Cultura se conseguisse baixar o preço das passagens aéreas. Isso iria permitir um maior trânsito para a música nacional e sobretudo maior interacção entre músicos. Precisa-se disto, até para ajudar o Dany a conhecer outros músicos de outras realidades..."

(*) Leia-se tão bem. E já agora uma pequena sugestão ao Expresso das Ilhas: mais atenção à gramática, à acentuação e à pontuação.

2 comentários:

Anônimo disse...

A propósito de um poema "Canção da minha rua" de Osvaldo Alcântara diz Gabriel Mariano (nosso parente) citado em um livrinho de Ondina Ferreira, Baltazar Lopes da Silva e a Música, p. 41, o seguinte: "perfilam-se neste poema a descoberta do sujeito poético de outros mundos, de outras músicas, de outras vidas, despoletadas pela canção tocada ao piano, numa espécie" de "viagem para novos territórios, operado o encontro e a integração... o individual parte em busca do colectivo..." "Afinal é dos sons, da melodia tocada no piano da vizinha, sai "uma melodia ponta-de-lança." - J.Mariano

Anônimo disse...

"Canção da Minha Rua
A vizinha em frente vive com um tropa
e tem um piano, amigo pontual do vira e do corridinho,
para que a antiga voz do Continente
assista ao banquete de confraternização
da minha rua vária e incongruente.
O tropa fecha os olhos,
recolhe-se numa lembrança velha,
e é esta carícia que a vizinha faz
aos cabelos cansados do meu companheiro
na minha rua.
Depois a vizinha recorda-se de que o mundo é mais largo,
há outros músicos, outros destinos, outras tropas,
e do seu piano sai uma melodia ponta-de-lança
para a penetração de outros territórios.
Morreu a carícia ao tropa
(a vizinha lembrou-se de que há negros americanos,
há pássaros cantores de outras florestas,
há cablocos, há poetas do morro)
e a sua canção sobe alvoraçada
como um abraço para todos os continentes... - Osvaldo Alcântara, Cântico da Manhã Futura". JMariano